Inflamado, o profeta:
- Já digo que é tarde da tarde nessa ruína, e o que vejo não tem revisão nem volta. A chuva que começou ao sul vai devastar todas as capitais do sudeste e os homens vivos ficarão intactos, mas seus computadores não ligarão mais. E não duvidem: vão continuar com seus dedinhos teclando o imaginário, ensopados em coberturas sem teto dos arranha-céus destruídos. Os poetas roerão dedos feridos de angústia e se misturarão, perdidos, em debates; precisarão reinventar a voz. Todas as cabeças vão estar gotejando entre perambulagens capitais. O asfalto vai se partir e nós, profetas, plantaremos trigo na frente dos supermercados e dos museus, que é pra ninguém temer, porque tudo vai ficar muito bem, podem confiar.
A noite vinha alaranjada luzindo as costelas do perro, e ambos iam sem previsões: um dueto de ganidos famélicos. Surge de uma dimensão apática um tilintar entre os dedos de um jovem, que lança setenta e seis centavos à mão do profeta: o valor exato daquela profecia.
- Já digo que é tarde da tarde nessa ruína, e o que vejo não tem revisão nem volta. A chuva que começou ao sul vai devastar todas as capitais do sudeste e os homens vivos ficarão intactos, mas seus computadores não ligarão mais. E não duvidem: vão continuar com seus dedinhos teclando o imaginário, ensopados em coberturas sem teto dos arranha-céus destruídos. Os poetas roerão dedos feridos de angústia e se misturarão, perdidos, em debates; precisarão reinventar a voz. Todas as cabeças vão estar gotejando entre perambulagens capitais. O asfalto vai se partir e nós, profetas, plantaremos trigo na frente dos supermercados e dos museus, que é pra ninguém temer, porque tudo vai ficar muito bem, podem confiar.
A noite vinha alaranjada luzindo as costelas do perro, e ambos iam sem previsões: um dueto de ganidos famélicos. Surge de uma dimensão apática um tilintar entre os dedos de um jovem, que lança setenta e seis centavos à mão do profeta: o valor exato daquela profecia.
10 comentários:
Gosto do último parágrafo,
ainda outro dia, lancei 2,00 na mão de um profeta gentileza-nostradamus... já a profecia, morreu na praia depois de muita água beber.
Um apocalipse peculiar, que não poupou nem a infernet...
Profetas são encontrados todos os dias na Sé. É um mar de profecias e de feitiços...
Passe por lá ao redor de 12h e deixe seus ouvidos a postos...
Tudo pode acontecer... ou não... a verdade será mesmo uma construção? Se for, é por isso que precisamos crer? E quanto vale essa crença? vale a viga que sustenta a parede, a telha, o cimento... e tudo o mais que forra nossas cabeças e faz escorrer o temporal? Valemos o que cremos? Ou cremos no que valemos? Por que os profetas têm essa pecha infame de indigência e loucura? Ou será a loucura que parece uma profecia viva? Ou será a indigência, nossa nudez profetizada?
E esses guisos em meus bolsos? Por que os dou e em troca do quê? Por que jogar migalhas aos que grunem nossa sorte se a nossa morte é a mais certa profecia, ainda que silenciada?
"...precisarão reinventar a voz"
Tá precisando mesmo. Adoro a internet, mas muita gente se esconde atrás dela.
Teu final é feliz, é o que importa.A profecia? seja qual for, merece os centavos quando tudo dá certo, pode crê.
anndixson.blogspot.com
Belo texto, com algo de sagrado e de profano...
E sabe meu caro, que, quem dá o valor exato pra tendeiro é mesmo quem paga. Pagou certinho e se tivesse dado cem tava certinho também.
Quanto ao profeta, tô com ele, e torcendo pra maquininha dele tá funcionando descentemente. Parabéns pra ele.
E pra ti, querido. Um texto novamente. Li pra caroll aqui em casa e ela também gostou.
Profeta, essa imagem já de praxe na tua prosa cada vez mais exata, mais sob medida. alta costura, aqui
Apocalipse segundo Victor Meira.rs
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